Longa vida a Freud

Longa vida a Freud

 

ENSAIO BIOGRÁFICO

 

Sigmund Freud foi um judeu austríaco fundador da psicanálise que perturbou o sono do mundo ao sustentar que a neurose era produto da sexualidade infantil.

Como Copérnico e Darwin, foi impiedoso com sua própria espécie ao afirmar a existência do inconsciente e, com isso, que o homem não é senhor de si mesmo. Ousou, ainda, fazer descobertas incompatíveis com a moral e bons costumes vigentes à sua época.

Sua maior descoberta – o inconsciente – diz que uma parte de nós mesmos é desconhecida e que possuímos desejos sexuais e impulsos agressivos.

A partir de 1895, começa a anunciar suas ideias ao mundo e sobre a existência de uma sexualidade infantil como algo inerente à construção psíquica do sujeito. Torna-se, então, alvo de reações de incredulidade, de desprezo e, muitas vezes, de ira, por parte de seus colegas médicos e de seus contemporâneos.

Ao anunciar à sociedade do fim do século XIX suas explorações das profundezas da alma, coloca-se como um único mortal a chegar mais próximo de uma explicação para o insondável mistério do comportamento humano.

Sua obra veio a influir na literatura de todos os países. A psicanálise tem hoje uso comum de seus jargões sugerindo a extensão de sua influência.

Sua influência é mais abrangente e profunda do que poderia esperar de um escritor. Todos nós usamos a linguagem psicanalítica. Até os críticos mais ferrenhos acabam envolvidos, em algum nível, pelas ideias freudianas. A psicanálise veio, definitivamente, mudar a maneira como pensamos acerca de nós mesmos. Não se conhece nenhum pensador sério que negue a existência do inconsciente, sendo que essa ideia parece que terá longa vida…

As mudanças ocorridas na humanidade, desde a era vitoriana aos dias atuais, não parecem constituir obstáculos aos fundamentos de suas teorias sobre a natureza humana. Ele próprio sabia que essas diferenças seriam levadas como desafio. Embora muitas críticas tenham procedência, como em relação à questão da cura, da duração do processo analítico, estas são questões que seus herdeiros foram trazendo para a psicanálise. Mas, nada disso invalida o valor e a importância de suas descobertas para os “males” da saúde mental.

Podemos avançar no tempo e pensar se Freud morasse hoje em Nova York, Pequim ou Rio de Janeiro e tivesse contato com os avanços da química cerebral, o papel dos neurotransmissores na formação dos pensamentos e emoções, ficaria fascinado e tentaria buscar “inimigo” como aliado.

O Prozac e outros medicamentos avançados podem até modificar os sintomas dos “males” psíquicos, porém, nenhum deles consegue alcançar sua origem.  Só a psicanálise pesquisa a doença da alma. A busca pela natureza humana continuará sempre (com ou sem remédio de efeito anestesiante).

A todo o momento, se parece “descobrir” o gene de algo, sem que venham a contribuir efetivamente para a “cura” desses “males”.

Todos sabemos que somos o resultado de interações de causas psicológicas, fisiológicas, biológicas e sociais. A psicanálise não faz objeção a essa visão multidisciplinar, ao contrário, a neopsicanálise procura esses conhecimentos para uma integração, trazendo de volta a ideia original de Freud que o nosso corpo é a nossa fonte de vida.

Em 1890, Freud escreveu a Fliess: “Não devemos esquecer que a nossa base é biológica, sem a qual estaríamos em algum lugar pelos ares“.

Haverá, sempre, alguém investigando o cérebro humano; sabemos que ainda há algo mais dentro dessa estrutura biológica, o que exatamente ainda não sabemos. Nossa ideia é vaga e há muito o que pesquisar sobre a mente e isso está sendo feito. Temos laboratórios de pesquisa dentro desta visão integrada em Paris (Universidade de Paris VII), na Inglaterra (grupo de neurobiólogo e psicanalistas) e em São Paulo.

A dificuldade para comprovações científicas é testar e checar a existência do inconsciente.

A possibilidade é a cura pela linguagem, sendo a psicanálise uma prática do falar e do escutar. Procura tratar dos problemas enfrentados pelas pessoas no seu dia-a-dia. – O que faz a vida valer a pena? – é uma de suas questões centrais.

O obstáculo foi  ficar atrelada à tradição médica, procurando curar “doentes” quando estes não existem, se  pensarmos que, o que “adoece” o ser humano, emocionalmente, é estar alienado de si mesmo.

É a ciência da singularidade, onde sua ajuda é buscar o que cada um deseja para si, dentro de uma relação direta com a individualidade e a história de vida de cada um.

A psicanálise foi a grande presença do século XX produzindo uma verdadeira revolução no olhar do homem para o mundo e para si mesmo. As descobertas freudianas mudaram a educação e os costumes; a presença do pensamento psicanalítico é evidente em todos os meios de expressão.

Mas ela também provoca muitas resistências. Não propondo alívio rápido para os sofrimentos do ser humano, não seduz e está na contramão de uma sociedade consumista, do prazer imediato e, também, de algumas práticas mágicas que parecem tanto ao nosso alcance como uma solução rápida e fácil.

“A ilusão parece ser mais fácil que a verdade”

 

Katia Santos

Psicanalista